fevereiro 27, 2012

Austeridade: a se manter solteira, será morte certa


No Público de hoje, João Carlos Espada anota o fato de, nos EUA, estar a ser lançado à opinião pública a ideia da redução de impostos

Causando a estranheza geral no contraditório face ao que sucede na Europa.

O que não refere o articulista é que as propostas centram-se na redução (ou até anulação) dos impostos sobre os rendimentos. Apenas…

A verdade é que não há nada que admirar.

Se nos dias de hoje, a austeridade é necessária nos países desenvolvidos, mais importante seria que essa austeridade fosse acompanhada por uma revisão, de alto a baixo, do sistema fiscal e do sistema de financiamento dos encargos sociais.

O problema nos países desenvolvidos é de défice. Défice que resultou da negação das democracias (por efeito – ou defeito - do sistema eleitoral) em evidenciar a necessidade de ajustar em baixa as condições de vida das suas populações, face ao crescimento dessas mesmas condições de vida - mesmo que para patamares irrisórios do ponto de vista ocidental - para gigantescas massas populacionais em países emergentes (China, India, Brasil, etc).


O trabalho deslocalizou-se para essas economias e, com ele, a produção.

A opção alternativa à austeridade – anotam muitos – seria a injeção de dinheiro. Ora, seria uma decisão errada. 

injeção de dinheiro apenas poderia resultar caso não fosse um sinal no sentido inverso ao desejado; caso a nova liquidez se fixasse garantidamente no País e dinamizasse a economia produtiva, principalmente nos sectores mais básicos (primário e indústria); caso esse novo excedente não acabasse por contribuir para o aumento da dívida através das importações, demasiado entranhadas nas economias desenvolvidas; e caso as aplicações financeiras interessantes (para onde convergem os lucros e a poupança) não estivessem, claramente, no exterior.

A austeridade poderia resultar caso os gastos excessivos resultassem de forma evidente, de compras de bens e serviços não essenciais, ao exterior; caso as economias mais desenvolvidas não estivessem fortemente tercerizadas; caso os setores primários e secundários não tivessem sido deslocalizados e canibalizados pelas importações; caso o sistema fiscal não dependesse de forma tão decisiva de impostos sobre o rendimento; caso a (falta de) liquidez não fosse um problema.

É evidente que, num mercado financeiro globalizado em que a liquidez voa para onde é mais remunerada e para onde fica mais segura, não serve de nada injectar dinheiro e sempre mais dinheiro. Essa liquidez extra desaparece num ápice. Obrigando a outra injecção logo a seguir. Numa espiral cujo fim só pode ser o descalabro. É como pretender manter um balde, com furos, sempre cheio de água, não tapando os furos mas … deitando-lhe uma e outra vez e sempre, mais água.

Assim, resta a austeridade. No sentido do ajustamento do consumo às disponibilidades reais de cada um, de cada empresa, de cada região, de cada país.

Mas sem ajustes estruturais, a austeridade por si só, será um redemoinho que não nos levará a sítio nenhum (ver caso da Grécia). Pois a cada ajuste, haverá menos economia, menos receitas fiscais, mais desemprego, mais despesas sociais. Mais défice, mais dívida e tudo regressa ao ponto de partida. Mais austeridade, mais...

Pelo que se tornarão necessárias medidas acessórias:

Erradicação total de todos os impostos que não o imposto sobre o consumo.
Eliminação do sistema de financiamento do sistema social sobre o trabalho.
Redistribuição do trabalho disponível através de uma flexibilização do tempo de trabalho e do rendimento salarial (até menos 20%) por iniciativa do empregador. Abrindo “espaço” para uma maior empregabilidade e redução de encargos sociais.


Esta será a única receita possível para aumentar a competitividade dos nossos produtos, no exterior, mas também no interior (nunca ninguém se lembra da concorrência à nossa produção) no confronto interno com os produtos importados.

A realidade é que o custo dos nossos produtos incorpora os impostos sobre o rendimento e os encargos sociais. O que não acontece com os produtos externos. Este confronto é desigual e de resultado (para nós), obviamente negativo …

A verdade é que se o sistema fiscal só actuar sobre o consumo, também esses produtos externos, quando consumidos, passam a contribuir de igual forma - e em concorrência sã com os nossos produtos - para os nossos impostos e para o financiamento do sistema social. 

Para além disso, uma quebra da economia de 1% terá impactos mais ou menos a esse nível nas receitas fiscais. Pelo contrário, um sistema coletor como o actual, baseado nos lucros (e outros rendimentos) cairá muitíssimo mais nesse enquadramento económico. Isto porque o mesmo foi desenhado para uma situação de crescimento, o que, atualmente - para os países desenvolvidos - é uma quimera sebastiânica


Não virá mais… apesar de estarem todos os nossos líderes fixados nela.

Cegos, a caminho do abismo.

fevereiro 22, 2012

Dívidas das empresas públicas a pagar por todos

"O secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, disse ontem que as dívidas das empresas públicas de transportes serão assumidas pelo Estado e garantiu que não serão "nem os utentes nem os trabalhadores" a pagá-las."

Pois. Pagarão os contribuintes que nunca usaram, beneficiaram ou passaram perto desses serviços altamente mal geridos, deficitários e subsidiados.

Mas, reconheçamos, haverá poucas saídas. Daí que estou tendente a aceitar a solução com uma condição: a partir deste ponto zero da dívida, a gestão deixa de ser deficitária e as indemnizações compensatórias passam a ser suportadas pelos contribuintes locais.

Será possível?

fevereiro 17, 2012

Incentivos à natalidade, tudo tretas

Lido o post de Ferreira de Almeida no 4R, só tenho que concordar com tudo o que lá é escrito. Realmente, as medidas de incentivo à natalidade em Portugal não falharam. 

Simplesmente inexistiram…

Mas, para além da irrelevância fiscal da existência dos filhos, acrescentaria mais alguma coisa: 

Lembro-me das medidas facilitadoras do aborto e do casamento dentro do mesmo sexo. Sem fazer qualquer análise qualitativa das mesmas. Apenas constatando que daí, filhos e renovação demográfica, nada resultará...

Lembro-me dos cortes no abono de família.

Lembro-me das - mais atuais - decisões no campo laboral. O alargamento da idade de reforma, o aumento do número de dias de trabalho (menos feriados e férias), mais meia-hora de trabalho gratuito. Fixando por mais tempo, a trabalhar, quem tem hoje emprego (mesmo que com muito menos formação de base) e adiando qualquer possibilidade dos jovens acederem ao mercado de trabalho. Se a isto juntarmos o facto do trabalho se estar a deslocalizar e estar cada vez menos disponível...

Lembro-me das reduções de rendimentos e dos benefícios fiscais (que incidiam nos gastos mais relevantes das famílias - habitação maior, transporte próprio, saúde e educação). 

Tudo medidas que reduzem a (necessária) qualidade de vida das famílias e, pior que isso, eliminam qualquer possibilidade dos jovens acederem ao mercado de trabalho em tempo útil para que se criem as condições necessárias para o aparecimento das famílias estruturadas. Ambiente essencial para o aparecimento de filhos, na quantidade necessária à renovação da sociedade.

A (melhor) distribuição do trabalho existente deverá ser a primeira medida relevante a tomar. Depois, tratar de aumentar a quantidade de trabalho disponível. O que não será fácil face à globalização que nos coloca em competição com quem produz na China, Índia e Brasil...

fevereiro 16, 2012

Grécia e troika, Portugal e os outros

O exemplo da Grécia tem servido para os keynesianos (e não só) colocarem em causa o modelo da austeridade, adoptado pela troika (e por quem o negociou) na resolução da questão da dívida soberana.

Esses, vão anotando a péssima situação grega e defendem a injeção de mais recursos financeiros no sistema, ao invés da adoção do modelo da austeridade.

A troika insiste e vai criando sucessivos planos de financiamento (ajuda) baseados em mais e mais austeridade. A instabilidade política e social cresce e tudo se coloca em causa.

Todos têm razão, mas ninguém aponta a solução correta.

A verdade é que mais austeridade não trás crescimento económico. E sem crescimento económico, mantendo o modelo actual, a dívida não é suportável.

A verdade é que mais austeridade não resolve o problema do défice (o que realmente importa) pois se economia cai (ou não cresce) as receitas fiscais caiem muito mais. Porque o modelo fiscal não é apropriado para um sistema recessivo. Porque foi construído para um modelo de economia em crescimento constante (e garantido).

A verdade é que injetar dinheiro apenas adiaria o problema. Pois estaríamos simplesmente a alimentar mais um monstro que, estruturalmente, está criado para gastar sempre mais do que dispõe.

Já sabemos que as populações dos países desenvolvidos terão – todas – de se ajustar a níveis de vida mais frugais. E todas, significa mesmo todas. Incluindo alemães e americanos. E isso far-se-á em recessão. Porque, simplesmente, há centenas de milhões de chineses, indianos, brasileiros e outros a conquistar o trabalho disponível globalmente e à espera da sua vez (de aceder a uma pequena quota parte da riqueza mundial).

A verdade é que não haverá mais “mercados financeiros” disponíveis para suportar défices e refinanciamento de dívidas soberanas. Nunca mais. Nem agora, nem no futuro. E, como veremos, isso acontecerá com todos os países que, gradualmente verão os seus “ratings” cair para nunca mais se reerguerem. É uma ilusão pensar que os que agora estão fora desses “mercados” um dia voltarão aos mesmos. A realidade demonstrará que, pelo contrário, a esses países se juntarão muitos (ou todos os) outros que passarão a ser simplesmente ignorados por quem detém recursos financeiros e que os colocarão noutras paragens mais seguras e rentáveis.

Os mercados financeiros na Europa estão – para a Europa – como estiveram em Portugal na fase ilusionista de Sócrates. Aí, há cerca de um ano, nos leilões da dívida soberana portuguesa, os “mercados financeiros” – soube-se depois - eram apenas os bancos portugueses “travestidos”, a aplicarem recursos que acabavam de recolher no BCE. Hoje, passa-se exatamente o mesmo, com o BCE a emprestar centenas de milhares de milhões a 1% e os bancos europeus a comprarem dívidas soberanas. É caso para dizer que não aprendem, mesmo.

São tudo adiamentos de um problema. Que aparecerá em grande, dentro de pouco tempo.

Como já escrevi, a solução passará por:

1)Reconhecer a evidência de que vamos todos “empobrecer”. O ajuste do nível de vida em baixa faz-se em recessão.

2)Que não haverá mais crescimento económico (pelo menos antes de descermos bastante) pelo que todo o ajuste deverá ter isso em conta. E atualmente, não tem…

Assim, os países devedores terão que tomar as rédeas da situação. Unilateralmente. 

E como?

3)A dívida soberana deverá ser congelada (a cada vencimento de uma tranche de dívida, a partir desse momento, serão entregues títulos novos a 30 anos, com juros Euribor e amortização de 1% ao ano). Fundos, BCEs, troikas, FEEFs e outras ajudas internacionais passam a ser canalizadas para a defesa dos credores que não quiserem - ou não puderem - se ajustar a esta solução, e que possam originar um problema sistémico. Comprando a esses credores, esses títulos no mercado secundário (com ou sem haircuts).

4)O modelo fiscal desses países terá de ser totalmente alterado (e simplificado). Acabam-se com todos os impostos atuais, com exceção do imposto sobre o consumo. Que terá as taxas necessárias (elevadas o suficiente para compensar todos os outros impostos). A máquina fiscal, liberta da situação anterior, de gestão complexa é reorientada para a fiscalização e para a garantia de cobrança fiscal sobre o imposto único restante. Só este modelo manterá a receita fiscal equilibrada face (e proporcional) ao PIB, no cenário de queda da economia.

5)Todos os encargos sociais também se introduzem no imposto sobre o consumo. Eliminam-se todas as retenções e encargos sociais sobre as empresas. Desta forma os encargos sociais são suportados por todos (afinal todos usufruem dos benefícios) e não apenas pelos trabalhadores. Desta forma os produtos externos passam a ser taxados com fins sociais, da mesma forma que a produção nacional (antes isolada neste aspecto), eliminando-se, desta forma, uma das maiores desvantagens comerciais entre as produções internas e externas.

6)Concretiza-se uma desvalorização salarial generalizada. Na Grécia e em Portugal já feita, pelo menos, na função pública. Poderá ser associada a uma redução do tempo de trabalho, o que permitirá que as empresas se ajustem à realidade de novos níveis de procura - em baixa - que se crie mais emprego (cada um com menos trabalho) e que se evite o desemprego, a falência e a desarticulação social.

7) Com os custos laborais reduzidos (através das duas medidas atrás indicadas) poderá haver mais exportações e mais trabalho. E com menos rendimentos disponíveis haverá menos despesa e - espera-se - menos importações. Neste novo paradigma, os défices terão que ser eliminados pois não haverá quaisquer "mercados financeiros" nem "investidores internacionais" que aloquem qualquer recurso financeiro a estes países para o respectivo financiamento...

8)A liquidez cairá abruptamente (o dinheiro existente voa para outras paragens - aplicações rentáveis no exterior - e a poupança caí pela pressão da auteridade) pelo que terão de ser implementados processos de "encontro de contas" - sem dinheiro vivo interveniente - onde se incluirá o Estado, no processo de pagamento de serviços e cobrança de impostos. A fim da economia não parar.

9)O país mantém-se no Euro mas as compras ao exterior passam a ser feitas a pronto pagamento.

10)O suporte social passa a ser determinante neste ambiente de ajuste em baixa. Na garantia dos serviços sociais mínimos para ocorrer aos casos mais dramáticos. Evitando a desarticulação social e a rotura. Focalizando a disponibilização de alimentação, modelos que salvaguardem a habitação (que poderá “explodir” com incumprimentos de crédito) e na saúde, provavelmente através de novos modelos de intervenção baseado num seguro de saúde básico generalizado, a suportar pelo Estado.


11)A estas medidas juntam-se outras, de incentivo à poupança que fique - garantidamente - no país e à dinamização da economia: os títulos seguros (ler eurobonds post1, post2, post3) e os títulos comerciais.

Chegado ao ponto de ajuste, ao fim de vários anos, a vida nestes países será bem diferente, mas a perspectiva poderá ser bem mais positiva. Um arranque a partir do zero.

fevereiro 14, 2012

MEO KANAL


Na semana passada, a MEO lançou um novo serviço inovador. O MEO KANAL.

É, realmente, uma pedrada no charco.
Julgamos, até, que seja uma antecipação em relação ao iTV da Apple que estará prestes a ser lançado. A verdade é que é novo, inovador e funciona mesmo.

Em 3 dias já atingiu os 3.000 canais criados. Todos (os seus clientes) podem criar canais. E disponibiliza-los de forma pública ou pessoal (neste caso é necessário um código).

Ao clicar na tecla verde e no número do canal (6 algarismos) acede-se ao conteúdo do mesmo.

Se serve para uma família partilhar conteúdos, a porta abre-se para muito mais. Para já, está disponível o essencial. Uma perspetiva do que (muito mais) aí virá.

Algumas sugestões:

Estes canais, poderiam ser visualizados pela net. Pelo menos para os clientes MEO.
Poderia ser criada a possibilidade de criar vários playlists em cada canal.
O ecrã da programação poderia ganhar mais algum protagonismo. Talvez até, se aproximando de um modelo de vídeo-blog em que cada vídeo poderia ter associado um pequeno texto (160 caracteres). Esse ecrã, acessível pela tecla [i] + Programação, teria o aspeto de um blog com um feed de vídeos com texto (tipo notícia). Um clique no ok desencadearia o vídeo em questão. Atualmente, a navegação nas páginas da programação é algo penalizante.

Depois, poderá vir tanta coisa:

Acessos pagos (micro pagamentos entre as contas MEO, que poderia reter uma percentagem).
Conteúdos pagos à peça (um jogo de futebol, uma peça de teatro em direto ou não).

Um mundo que se abre…
Parabéns MEO. 

fevereiro 09, 2012

Keynes tinha razão!

Tinha razão ... no seu tempo. Já não teria hoje.

Hoje, há outras variáveis.

1)Hoje, os países emergentes têm todas as condições para produzirem. Nomeadamente a principal: disponibilidade de capital. Ao capital juntam a mão de obra barata. Pelo que, ao longo dos últimos anos (já alguns) foram atraindo o investimento e o trabalho. A produção e a riqueza. E foram emprestando.

2)Hoje, os países desenvolvidos perderam a produção. Com ela o trabalho e a riqueza. Não se ajustaram à situação (a democracia e o sistema eleitoral não ajudaram) e passaram a viver em défice. E, para manter os níveis de vida, prometidos aos eleitores, foram pedindo emprestado, acumulando dívidas.

3)Hoje, qualquer injeção financeira na economia só levaria ao crescimento do modelo gerador de défice (do monstro). Mais despesas, mesmo que mais receitas. Maior défice, mais dívida. Se uma sociedade tem 50 e gasta 60, o mais provável se lhe derem 55 é que gaste 66…

4)Mais dinheiro na economia não traria a fábrica dos Iphones de regresso aos EUA. Quanto muito, levaria ainda mais americanos a comprar mais Iphones… aos asiáticos.

A Alemanha sabe que não pode injetar dinheiro na Economia. Esse dinheiro arrisca-se a ir para a China, a troco de IPads e LEDs ali fabricados e a voltar nas mãos dos investidores asiáticos, nas suas compras de empresas na Europa (e, não demora nada, na Alemanha). Ou para sustentar dívidas soberanas. Que, nos últimos anos, passaram a ser um “tapete” cada vez maior sobre o qual nos movemos. Só que... a simples ameaça de ser retirado coloca-nos, a todos, em sentido, nas mãos desses credores.

O caminho que se segue é de ajuste económico e de nível de vida (em baixa), empobrecimento e recessão. Situação que, sendo dececionante face às expectativas que os nossos líderes e políticos sempre nos apontaram, tem de passar a ser enfrentada e gerida, não sendo solução entrar em lamurias e pieguices.

Neste caminho de austeridade, o modelo fiscal terá de ser invertido. Caso contrário, nada resultará. Ficaremos eternamente à espera de um crescimento económico (que não virá) e as receitas fiscais serão cada vez menores (ao ritmo da recessão provocada pela austeridade), inviabilizando qualquer ajuste no défice público e complicando ainda mais a sustentação e o pagamento da dívida.

Hoje, por hoje, haverá que assumir a situação: enfrentar a recessão como uma inevitabilidade a gerir o melhor possível. Congelar a dívida, eliminar o défice estrutural e alterar o sistema fiscal eliminando (sim, eliminando) os impostos sobre o rendimento e aumentando (até onde for necessário) os impostos sobre o consumo.

Tudo o resto são engenharias financeiras, que só adiam (e fazem crescer) os problemas. Remedeios velhos, de um passado que não voltará.

Pedro Lomba

Hoje, no Público, entre a lamúria (de Jorge Sampaio) e a pieguice (de Passos Coelho), vai uma pequeníssima distância de conteúdo mas uma enorme diferença (de tratamento jornalístico e político). Um artigo fantástico que pode ler aqui. (cachimbodemagritte)

fevereiro 08, 2012

Merkel e a Madeira - comunicado do Governo Regional

Após referencia à Madeira, ontem, por parte da chanceler alemã, como exemplo da má utilização dos fundos comunitários, o Governo Regional da Madeira emitiu um comunicado sobre o assunto. A ler aqui.

Realmente, não deixa de ser estranha a afirmação face ao rigor que é imposto pela União Europeia à referida aplicação. A Madeira inclusive, foi, por mais do que uma vez, bonificada com verbas extra, pelo facto de as aplicar exemplarmente.

Havendo algo de errado, será nas políticas comunitárias de coesão. E não nas estruturas e regiões que as aplicam e que até são elogiadas por isso.

Aparentemente (já interveio o consul alemão na Madeira), Merkel terá sido mal traduzida (atenção à falta de rigor ou à má-intenção neste processo).

A chanceler terá procurado um bom (excelente) exemplo de aplicação de fundos comunitários que não resultaram conforme seria devido...

Colocando em causa, não a Madeira, mas o sistema de apoios comunitários de coesão.

fevereiro 07, 2012

Grécia: o fim da linha para o “mundo desenvolvido”

É o início do fim.
Ou o início de uma nova era. Como se quiser.

Será brevemente confirmado que tudo o que se tem feito, até agora, no tratamento do problema da dívida soberana, apenas respeita a medidas de remedeio e de adiamento do momento em que se tem de encarar de frente a realidade. Uma nova realidade.

O “mundo desenvolvido” terá de empobrecer (pelo menos um pouco), para que o “resto do mundo” possa enriquecer (por pouco que seja). Assim, para que algumas centenas de milhões de chineses, indianos, brasileiros e não só, possam ter a sua vez, os habitantes dos países desenvolvidos (incluem-se os EUA) terão de ceder.

Para estes, um longo período de ajuste em baixa aproxima-se. Resta saber como será gerido. Em convulsão ou com contenção?

O caso da Grécia tem solução. E terá que ter, pois, de seguida, virão todos os outros países desenvolvidos. Mas todos mesmo.

E qual é essa solução?

1)Encarar a situação de frente. Reconhecer que toda esta situação é nova e que soluções antigas não funcionam. Assim, o País endividado e à porta do incumprimento, assume as rédeas da situação.

2)Unilateralmente, decide sobre o congelamento imediato da dívida soberana, sem prejuízo de assumir com o seu pagamento. Ao mesmo tempo, determina que passa a viver em situação de défice zero, inibindo-se de qualquer ajuda financeira internacional, quer para o pagamento da dívida (que é congelada), quer para o suporte do défice (que deixa de existir), quer para o comércio internacional, que se passa a fazer a pronto pagamento.

3)Assim, passa a emitir novos títulos de dívida soberana (que serão entregues aos credores à medida que as tranches de dívida se vão vencendo). Estes novos títulos terão um prazo de vencimento longo (30 anos), taxas referenciadas (Euribor) e amortização anual obrigatória (a pagar juntamente com os juros) de 1%. Para que esta situação não se confunda com a bancarrota, estes títulos deverão ser tratados "religiosamente". Sem quaisquer falhas. 

4)Provavelmente, para manter o Euro, será necessário uma desvalorização remuneratória total, aplicável a todo o País (e não apenas à função pública). Aí, as leis laborais abririam a porta à possibilidade (decidirá o empregador) de reduções unilaterais de ordenados, até 10% sem redução de horário ou até 20% com redução horária. A unidade de trabalho (emprego) passará a ser mais flexível, por iniciativa da empresa. Desta forma, as empresas poderão ajustar os seus custos fixos a uma menor procura, sem despedir. O trabalho disponível (cada vez menos) poderá ser melhor dividido. E as exportações poderão ser mais competitivas devido ao custo inferior do trabalho.

5)A “ajuda financeira internacional” deixa de suportar os devedores e passa a recair nos credores. Estes, ou “aguentam” com os novos títulos (e com as suas condições), ou vendem-nos no mercado ao preço que este definir. As perdas corresponderão ao custo do risco assumido na compra da dívida em questão. A “ajuda financeira internacional” pode intervir para evitar roturas sistémicas. Comprando, no mercado secundário, ou com haircuts negociados, os referidos títulos. Mas sempre na defesa dos credores e não dos devedores (essa fase já passou).

Seja lá como for, com esta solução ou com outra qualquer (como seja a bancarrota e saída do Euro), os mercados financeiros nunca mais sustentarão quaisquer dívidas soberanas. Os ratings actuais deixarão de ser compatíveis com uma solução de haircut aplicada à dívida da Grécia. E, rapidamente cairão para níveis de lixo. Todos. E aí, todas as disponibilidades financeiras (bem geridas) “fugirão” inapelada e rapidamente deste tipo de aplicações, deslocalizando-se para os países emergentes, onde estarão mais seguras e serão mais rentáveis.

A expectativa de, em 2013, 2015 ou 2020 os países endividados e sob medidas de resgate regressarem aos mercados é pura ilusão.

Pelo que, o caminho que atrás se anota, como o único disponível para a Grécia, ajustar-se-á, também, para todos os outros Países desenvolvidos. Passando por Portugal, mas incluindo a Itália, Bélgica, Espanha, França, Holanda, Alemanha e … EUA.

Mais uma vez, a Sociedade Ocidental, nos termos que a conhecemos, chegou ao fim. Resta saber se se salvará a sua forma (através de um ajuste em baixa nos níveis de vida, depois de reconhecida e enfrentada a situação real – esta que descrevemos), ou se tudo se perderá em remedeios e adiamentos, tal como temos vindo a assistir, por parte dos líderes atuais, dignos representantes de um tipo de vida e de sociedade que levaram até ao esgotamento final.

fevereiro 06, 2012

Bancos, lucros privados e prejuízos públicos


(gostaria de saber) que negócios (e com quem) custaram dinheiro (e prejuízos) ao Banco.

É usual, nos últimos tempos, se refletir sobre o período de “vacas gordas” da Banca, baseada em alavancagens, dívida e crédito muito para além do razoável (dizemos nós, hoje).

A verdade é que foram anos consecutivos de muitos lucros.

Entretanto, como todos os “esquemas de Ponzi” (ou Dona Branca), este também teve um fim. Pelo que se teve de iniciar um período de desalavancagem e redução de dívida e aumento de reservas por conta de crédito mal parado.

Também como qualquer bom “esquema de Ponzi”, todos os que entraram e saíram, ficaram bem (ou muito bem) e todos aqueles os que estavam “dentro” na rotura ficaram mal. Mas, terão mesmo ficado? Não. É que este "esquema de Ponzi" estava seguro pelo Estado. Porque se considera que há um perigo sistémico para a Economia. Assim, cabe ao Estado assumir o prejuízo final. E, quem diz o Estado diz os contribuintes (todos nós).

Não me choca nada o prejuízo dos Bancos privados. Tirando, talvez, um pouco, o caso do BCP/Millenium, um bom banco, em tempos, que acabou desbaratado pela intervenção política e não só, de um grupo de indivíduos, com origem na CGD, ali colocados por Sócrates.

Claro que se essa (ou outra) banca recorre a fundos públicos para se manter, gostaria de saber algo mais. Sobre que negócios (e com quem) custaram dinheiro (e prejuízos) ao Banco.

Pior ficamos no que se refere à CGD. Aí, os prejuízos são públicos. Mais uma vez, sendo assim, gostaria de saber, com clareza, que negócios (e com quem) custaram dinheiro (e prejuízos) ao Banco.

Mas muito pior ficamos, no que se refere a casos como o do BPN. Aí, os prejuízos são a fundo perdido. Prejuízos particulares pagos por nós. Aí, não gostaria. Exigiria. Saber que negócios (e com quem) custaram dinheiro (e prejuízos) ao Banco. Uma pipa de massa. Um buraco de milhares de milhões.

Pois não tem sentido que fiquem impunes os que usufruíram de negócios e créditos e que não os pagaram. E que, quanto aos que entraram e saíram (a tempo) no “esquema de Ponzi” maciço que se desenvolveu nesse Banco, para que, pelo menos, se lhe possa apontar o dedo. Aí, talvez não como culpados, mas pelo menos como coniventes e benificiários, legais mas imorais do esquema. Pago, no final (agora) por todos os contribuintes.

No mínimo, gostaria de ver divulgada a lista dos créditos (os significativos) do BPN e da CGD, não pagos e dados como perdidos. Com valores, datas, destino e nomes de quem os aprovou e de quem os negociou. Mas não ficaria por aí: gostaria de saber a quem e a que valores o BPN comprou ações próprias com o dinheiro que não tinha (e que agora, todos estamos a pagar).

fevereiro 03, 2012

O complicómetro da Prova de Recursos


Hoje por hoje, são provas de recursos para a acção social universitária, para comprar passes nos transportes, para aceder aos serviços de saúde, para pagar renda mais baixa, para obter o abono de família, para usufruir de medicamentos mais baratos, para isto, para aquilo…

São documentos de rendimentos, de subsídios, da segurança social a entregar em todo o lado. Exércitos de administrativos a calcular escalões e benefícios.

Tudo errado.

Porque não se simplifica, já que se entrou neste modelo?

Cada agregado familiar faria UMA PROVA DE RECURSOS junto à Segurança Social. A partir desse momento ser-lhe-ia atribuído (e a todos os seus elementos) um escalão social determinado. E, durante um ano, para todos os efeitos sociais, aquele contribuinte usufruiria dos benefícios que estivessem estabelecidos para a condição de recurso que se traduziu no escalão calculado.

É absurdo vermos filas de utentes para entregar papéis com declaração de rendimentos em n sítios diferentes, para que, nesses n sítios, n funcionários façam as mesmas n contas (sem se saber bem se chegam todos aos mesmos resultados).

Este sistema teria outra vantagem grande:

Todos os benefícios sociais obtidos por um agregado teriam que ficar registados sob os respectivos nºs de contribuinte. Com a finalidade óbvia dos mesmos se juntarem aos rendimentos e subsídios que, todos juntos, constituirão os recursos desse agregado familiar. 

E porque é de justiça social que se faça isto?

Porque sabemos bem que há famílias (com a mesma dimensão) cujos elementos não têm rendimentos do trabalho mas que a soma dos subsídios e dos benefícios sociais efectivamente usufruídos é superior à de outras que vivem apenas dos rendimentos do trabalho…

E, se não podemos evitar que a primeira viva a partir de parte dos impostos e contribuições da segunda, poderemos, pelo menos, considerar todos (mesmo todos) os recursos – rendimentos do trabalho, subsídios e benefícios sociais – de ambas, no acto de PROVA DE RECURSOS, para o cálculo do escalão social de ambas…

Hoje, sabemos bem, muitas famílias, com a mesma dimensão e tipologia, onde não há rendimentos do trabalho, vivem melhor que outras, que, pelo simples facto de terem rendimentos do trabalho integrados no seu rendimento (por parcos que sejam), ficam inibidas de aceder a apoios e benefícios sociais. E pagam tudo, por tudo.

Seria uma medida de justiça social simples…

fevereiro 02, 2012

Haircut na Grécia: solução ou abertura de uma caixa de Pandora?


Caixa de Pandora aberta, sem dúvida.

E não só na Grécia. Será a machadada final para todo o sistema de financiamento de défices e refinanciamento de dívidas soberanas.

A partir do momento que um haircut seja entendido como uma solução, está aberta, irremediavelmente a caixa de Pandora.

Daí para a frente, nenhum investidor livre e consciente (restarão, ainda, por algum tempo, alguns “investidores” menos livres que manterão ilusoriamente o sistema) colocará um euro ou dólar que seja no mercado de refinanciamento das dívidas soberanas, pelo menos, nos países que não tenham resolvido – claramente – a questão do défice (público, comercial e outros).

E, daí para a frente, haverá como que um “aspirador gigante de liquidez”, pendente sobre os países desenvolvidos, “sacando” toda a poupança (grande ou pequena) ou lucros libertos e direccionando-os para as aplicações realmente interessantes, em zonas do Mundo onde há crescimento económico, rendimento do capital e segurança na aplicação. A dívida soberana nos países desenvolvidos, antes sinónimo de segurança, perderá aqui, e neste haircut, toda a sua mais-valia. Toda mesmo.

Tentando encher de água, um recipiente furado…

Hoje, por hoje, alguns países acham-se salvaguardados de tudo isto. Alguns imprimindo papel moeda, outros dando acesso a fundos ilimitados a partir de Bancos Centrais. Nada de mais enganador…

A curto prazo, a liquidez tenderá a desaparecer rapidamente dos países desenvolvidos. O processo começou nos países (desenvolvidos) mais frágeis, no que respeita às suas balanças comerciais, com saldos negativos. Mas logo chegará a todos. Pois se hoje, o aspirador ainda retira fundos de países desenvolvidos para os debitar noutros, amanhã, o débito virar-se-à – exclusivamente – para os países emergentes. E isto acontecerá sempre e com todos os recursos financeiros libertos, que se inventem, imprimam ou se disponibilizem.

A desvalorização da moeda (excessivamente disponibilizada) e a travagem nas economias desenvolvidas será cada vez mais evidente e poderá originar roturas impossíveis de gerir.

E tudo isto acontecerá sempre, incontornavelmente e por uma razão muito simples: há centenas (ou mais) de milhões de pessoas, em países como a China, Índia ou Brasil, disponíveis para trabalhar a um custo ínfimo que, no entanto, para eles, significará maior riqueza e melhor nível de vida. Por isso, será para lá que irão os capitais e os investimentos. E também a produção e o trabalho

Como o planeta Terra é um sistema fechado e com os recursos já em sobre-exploração, quando se acrescenta ali, perde-se alguma coisa aqui…

Para que muitos ganhem um pouco, as populações nos países desenvolvidos terão de ceder algo nas posições ganhas ao longo de dezenas de anos. Resta saber quanto, com que rapidez e de que forma.

A solução passa por entender e assumir a realidade: que acabaram os anos bons e de crescimento nos países desenvolvidos. Que haverá que enfrentar anos duros, de ajuste, em recessão.

Assumir e gerir este processo com realismo será a única forma possível para evitar a rotura, a anarquia e o advir de uma pobreza extrema erradicada há dezenas de anos das nossas sociedades.

fevereiro 01, 2012

A defesa da impunidade do pequeno crime

Esta manhã, parte da imprensa escrita nacional publicita determinada repressão sobre situações de pequeno crime. E insurge-se contra os comerciantes - que reagem - e contra o sistema judicial.

João Gobern, na sua crónica diária, alinha no mesmo sentido e anota a sua indignação num caso em que um qualquer teria sido punido com multa de 500 Euros por ter 80 Euros em notas falsas na carteira.

E toda essa indignação justifica-se pela justiça não ser capaz de penalizar outro tipo e dimensão de crimes.

Ora, tudo errado. Crime é crime, grande ou pequeno. E a impunidade (errada) de uns não justifica a não penalização de outros. 

Caso contrário, teremos a anarquia total...

Pode parecer demasiada a pena do sem abrigo. Ou do falsário. Mas quantas situações desse tipo passam impunes? Desses prevaricadores e de outros? A verdade é que o acto que permitiu o flagrante e que permite a ida a tribunal não deve ser o primeiro, nem ser caso isolado. E não se pode ajuizar a pena apenas pelo caso em si. É necessário, também, passar as mensagens correctas:  de que o crime não pode compensar...

O problema não está na punição do pequeno crime. Estará sim nas razões que justificaram o acto, na condição do sem abrigo e na inexistência - próxima - de alternativa (uma instituição solidária que lhe garantisse higiene e alimentação mínima).


E está no complicómetro que se introduz no processo de análise e decisão (judicial) destas matérias.

E está no erro de avaliação de muita imprensa e no ponto de vista de comunicadores como João Gobern que chegam a milhões. E desvirtuam as realidades. Arriscando a possibilidade de serem passadas as mensagens erradas. 

O crime não pode ter compensação possível. Grande ou pequeno. Custe o que custar. Caso contrário, estará tudo perdido...

É que tudo começa na pequena criminalidade não punida. Depois, por acréscimo, vem sempre muito pior.